domingo, 27 de novembro de 2011

Seminário “O fascínio pelo imaginário e fantástico no século XIX através da obra de Drácula e a construção do seu mito”

No dia 22/11/2011, eu apresentei na Faculdade Saberes, em Vitória/ES, o seminário "O fascínio pelo imaginário e fantástico no século XIX através da obra de Drácula e a construção do seu mito", com o objetivo de elucidar as mentes menos conhecedoras sobre o surto de vampirismo que ocorreu entre os século XVIII e XIX na Europa e como isso culminou no sucesso da obra de Bram Stoker, Drácula. Abaixo segue o material que eu apresentei, espero que gostem:

O fascínio pelo imaginário e fantástico no século XIX através da obra
de Drácula e a construção do seu mito
Sestro Marsden
Drácula é o personagem-título do romance criado por Bram Stoker e publicado em 1897, se tornando o vampiro mais conhecido da modernidade e incitando no mundo a ideia de um ser poderoso e sem escrúpulos, capaz de qualquer coisa para saciar seus desejos. Seu inimigo, Van Helsing, o destrói se munindo de objetos relacionados à religião cristã-católica romana, como o crucifixo e a hóstia, além de usar o alho para afastá-lo e estacas para ataca-lo, crenças populares da Europa Oriental, região rica de mitologia vampírica. Mas antes de Drácula surgir ao final do século XIX, o mito do vampiro chegou a Europa Ocidental através de um surto de manifestações que levaram a investigações da igreja, que realizaram duas dissertações a respeito dos casos, assim como incitou o imaginário de muitos escritores que usaram o mito como base para suas obras.
Para melhor compreensão disso temos o caso de Arnold Paole, soldado sérvio que retornou para casa após um período de serviços prestados na Sérvia Turca, como era conhecido o exército daquela região. Ele comprou terras, se tornou agricultor e casou-se. Mas ele revelou a esposa que durante o período de serviços na Sérvia Turca fora atacado por um upirina[1], ao qual ele perseguiu até o cemitério e o matou. Comeu a terra do túmulo e cuidou das feridas com o sangue na intenção de se livrar dos efeitos do ataque, mas temia que ainda tivesse marcado, como uma maldição.
Paole então morre após um acidente, só que dias após sua morte um surto de visões começam a surgir e pessoas que disseram tê-lo visto, morrem. No 40° dia após sua morte, decidem desenterrar seu corpo. Acompanhados de dois cirurgiões militares, o povo da região aonde Arnold Paole residia abre seu caixão e o encontra como se tivesse sido enterrado há pouco tempo, somente com uma pequena camada de pele velha sobreposta a uma pele nova e com as unhas ainda crescendo. Eles estaqueiam o corpo do morto e ouvem um gemido, além de o sangue jorrar da ferida, mas não para por aí, pois as pessoas mortas, supostamente, por Paole, têm o mesmo fim. Em 1731, quatro anos após as mortes de Paole e suas supostas vítimas, uma jovem disse ter sido atacada por um homem chamado Milo, que havia falecido há pouco tempo. Desta forma o imperador austríaco nomeou o cirurgião Johannes Fluckinger para investigar o caso. Fluckinger se dirigiu a região de Medgevia, ao norte de Belgrado, aonde Paole havia nascido e residido e também local da aparição de Milo, para inspecionar o desenterro do corpo. Descobrindo-o em estado semelhante ao de Paole, foi ordenado o estaqueamento e a incineração do falecido. Numa busca pela resposta do motivo de uma pessoa ter se tornado vampiro depois de quatro anos, fora determinado que Paole houvesse “vampirizado” diversas vacas, sendo este o motivo do mais recente caso. Sendo assim, sob ordens do cirurgião nomeado pelo imperador, várias pessoas que haveriam falecido há pouco tempo foram desenterradas, estaqueadas e queimadas.
Essa pantofobia[2] relativa aos ataques de vampiros que tomou a região das Europas Central e Oriental foram abordadas pela Igreja Cristã-católica romana em dois trabalhos. O primeiro foi realizado em 1744 pelo arcebispo de Trani, região da Itália, Giuseppe Davanzati (1665-1755), que se chamava Dissertazione sopra I Vampiri[3].
Davanzati fora nomeado pelo papa Benedito XIV como patriarca de Alexandria quando a onda vampírica chegou à Alemanha. O bispo de Olmütz, Cardeal Schtrattembach, o convidou para participar das discussões acerca deste surto, que se originara com o caso de Paole, em 1727, daí então escreveu sua dissertação tendo como base os relatos deste caso e de estudo relacionados ao assunto.
Vampiri[4] era uma terminologia do vampir húngaro, que se originara do upír[5], e define o que Davanzati chamou de fantasia humana, com possibilidades de origem diabólica. Na sua argumentação, as aparições vampíricas se realizavam aos camponeses e analfabetos das classes mais baixas, cujo imaginário eram mais tendencioso do que para pessoas letradas. Mas sua dissertação foi superada pela do acadêmico francês Don Augustin Calmet, que escreveu em 1746 a Dissertations sur les Apparitions des Anges, des Démons e des Esprits, et sur les revenants, et Vampires de Hungrie, de Bohême, de Moravie, et de Silésie[6], que fora seu único trabalho a respeito do assunto.
Calmet, como acadêmico católico romano, havia lecionado Filosofia e Teologia na Abadia em Moyen-Moutier e trabalhara em um comentário maciço de 23 volumes sobre a Bíblia, além de tentar popularizar o trabalho de interpretação dela. O papa Benedito XIII chegou a oferecê-lo um bispado, mas ele recusou. A pesquisa de Calmet sobre os vampiros iniciou da mesma forma que a de Davanzati, por conta do surto de aparições que se iniciou em 1727 na Europa Oriental e se alastrou pela Alemanha. Na França não existiam relatos como aqueles, mas o acadêmico ficou impressionado com os detalhes dos testemunhos que corroboravam com a existência do vampirismo e não achava certo que fossem ignorados.
A definição de Calmet sobre os vampiros era que eles seriam pessoas mortas que retornavam de seus túmulos para perturbar os vivos, bebendo de seu sangue e, possivelmente, leva-los a morte. O único meio de eliminá-los seria desenterrando o corpo do suposto vampiro, cortando-lhe a cabeça, estaqueando uma madeira no corpo e queimando-o até que virassem cinzas. Mas Calmet tinha sérias críticas à histeria desenfreada que causou a exumação de vários corpos, aos quais achavam terem sido vampirizados, e suas mutilações. Também amainou o que Davanzati havia escrito sobre o fenômeno atingir somente as classes iletradas, referindo-se ao folclore popular das regiões, o parco conhecimento sobre as alterações dos corpos após a morte e sobre sepultamentos prematuros. Ao fim, Calmet deixa o assunto em aberto, não o concluindo, mas aparentando acreditar na existência de vampiros ao escrever “[...] que parece impossível não apoiar a crença que prevalece nesses países de que essas aparições na realidade provêm do túmulo e que são capazes de produzir terríveis efeitos tão difundidos e atribuídos a eles”[7].
Calmet, ao deixar em aberto a discussão sobre a existência ou não de vampiros, incentivou a busca por respostas a respeito deste ser folclórico que começara a se desenvolver na mente de poetas alemães, tanto que dois anos após a publicação de sua dissertação surge o poema Der Vampyr de Heinrich August Ossenfelder. Após a publicação de Ossenfelder, outros poetas alemães desenvolveram obras semelhantes, como Lenora de Gottfried August Bürger, Die Braut von Korinth de Johann Wolfgang von Goethe. Esses poemas chegaram a Inglaterra na década de 1790, quando William Taylor de Norwich traduziu Lenora para o inglês, que incentivou Samuel Taylor Coleridge a escrever Christabel em 1801 e Robert Southey que escreveu Thalaba the Destroyer.
Dois dos maiores incentivadores da literatura vampírica no início do século XIX foram Lorde George Gordon Byron e Percy Bysshe Shelley, tanto que em 1816, devido ao tempo que não permitia que transitassem pelas ruas de Genebra, Byron sugeriu que fossem escritos histórias de fantasmas para serem compartilhadas entre eles. Entre os convidados estavam, além de Shelley, Mary Wollstonecraft Goldwin, Claire Clairmont e John Polidori. As histórias começaram a ser escritas naquela noite e somente duas ganharam relevância após o encontro, uma delas fora escrita por Mary Goldwin, que mais tarde se casaria com Percy Shelley, e era intitulada Frankenstein. A obra se tornou extensamente popular, pois narrava um cientista que buscava descobrir como reanimar um corpo morto e quando conseguiu, este se torna um monstro, mas somente da ideia de infringir todas as leis da natureza, Mary Shelley, como é mais conhecida, conseguira imputar no imaginário humano a possibilidade de que a ciência era capaz de tudo, até mesmo dar vida aos humanos.
Outro membro da reunião que teve certo sucesso com sua obra foi John Polidori que escreveu o primeiro romance The Vampyre. A obra foi publicada em 1819 no New Monthly Magazine[8], e foi a primeira a gerar interesse dos ingleses pelos vampiros, antes somente interessantes para poetas. The Vampyre se tornou peça teatral na França e incentivou outros escritores a criar obras literárias sobre vampiros, como James Malcolm Rymer, que em 1840 publicou Varney, the Vampyre, e Joseph Thomas Sheridan Le Fanu que em dezembro de 1871 iniciou a publicação de Carmilla na revista Dark Blue[9] em quatro partes.
Carmilla contava a história de uma vampira que atormentava uma jovem e foi esta história a principal incentivadora para a criação de Drácula, pois depois de lê-la, Bram Stoker teve um pesadelo e iniciou o projeto para um livro sobre vampiros.
Impressionado com a abordagem do fantástico pelo escritor de Carmilla, Bram Stoker, que nessa época já havia escrito livros adultos e infantis, decide iniciar uma pesquisa.
Conforme descoberto pelo editor e pesquisador Marcos Torrigo e citado por ele na Introdução do livro “Drácula”, Bram Stoker aparentemente fez parte da Hermetic Order of the Golden Dawn[10], que buscava respostas sobre o imaginário que permeava o século XIX, e que possuía documentos que poderiam ser associados a Vlad Dracul[11], pai de Vlad Dracula, personagem-título da obra de Stoker.
Em um melhor entendimento sobre isso a necessidade do uso de um personagem da história da Europa Oriental na obra de Bram Stoker, cito Sandra Jatahy Pesavento que escreve sobre o imaginário:
“(As) representações teriam, na sua concepção, um fundo de apoio na concreticidade das condições reais da existência. Ou seja, as ideias-imagens precisam ter um mínimo de verossimilhança com o mundo vivido, para que tenham aceitação social, para que sejam críveis.” (S.J. Pesavento, 1995, p.22)
Dessa forma podemos compreender que Stoker ao usar Vlad, que também era conhecido como Vlad Ţepeş[12], busca criar alguma ligação com a realidade, já que este havia sido um sanguinário guerreiro da Igreja Cristã.
Com as informações sobre a família de Vlad e seu passou, e tendo como leitura o livro The Land
Beyond to the Forest
, de Emily Gerard, que narra com detalhes os costumes e tradições da região da Transilvânia, Bram Stoker desenvolveu sua obra. Ele junta as lendas do leste europeu, o envolvimento da Igreja na perseguição a estes seres demoníacos, um guerreiro romeno que lutou contra os turcos no século XV, para criar uma obra que influenciou – e ainda influencia – muitos trabalhos voltados para este tema, criando um mito que permeia o imaginário até os dias de hoje, pois como cita Roland Barthes em seu livro Mitologias: “O mito é um sistema de comunicação, uma mensagem.” (BARTHES, 2010, p.199), e Drácula funciona muito bem neste contexto, pois passa a mensagem da existência do vampiro dentro da sociedade vitoriana, abastecida pelo imaginário do fantástico com obras como Frankenstein de Mary Shelley e O Médico e o Monstro de Robert Louis Stevenson, que trabalham a ciência e o ocultismo lado-a-lado. Já o trabalho do mito e do fantástico desenvolvido por Bram Stoker se diferencia e dá mais destaque, pois busca em lendas que já vinham enriquecendo a literatura europeia sua base, usando uma região totalmente rica deste conteúdo, como a Transilvânia.
Bram Stoker não parece desconhecer o que criara, tanto que, com seu sócio e amigos, o ator Henry Irving, lança a peça Dracula, or The Un-dead no Lyceum Theater em 1897, no intuito de garantir os direitos sobre a obra, mas vinte e cinco anos depois, na Alemanha, o roteirista Henrik Gallen e o diretor Friedrich Wilhelm Murnau, apoiados por Albin Grau, diretor da Prana-Film, desenvolvem o filme Nosferatu, Eine Symphonie de Garuens[13]. O termo nosferatu vem do eslavo que significa portador de pragas. A locação se muda da Transilvânia para a cidade de Bremen, na Alemanha, e os nomes dos personagens se alteram, como Drácula passa a se chamar Conde Orlock, mas o filme é nitidamente baseado na obra de Stoker, o que trás problemas para a
película, que sofre um processo de direitos autorais e é ordenado que todas as cópias sejam queimadas, alimentando ainda mais o mito sobre Drácula.
O que alimenta o imaginário acerca de Drácula são todos os trabalhos midiáticos desenvolvidos com base na mitologia por trás da obra, como o sol, o espelho, os objetos religiosos (no plural mesmo), alho, rosas silvestres, sendo que alguns desses já foram desenvolvidos para o cinema, como o sol.
O mito do vampiro ficou mais enriquecido após a obra Drácula, escrita por Bram Stoker, e se tornou um fenômeno, mesmo tendo anteriormente escritores do mais diversos, se baseando neste folclore do leste europeu. Desmentindo Davanzati, podemos ver, com o crescente de obras sobre vampiros, que a influência do mito vai além do imaginário de um povo iletrado e camponês, podendo enriquecer-se na mente até mesmo de eruditos e assim construindo um mundo fantástico.

Referências bibliográficas:
BARTHES, Roland. Mitologias. 5 ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2010.
MCNALLY, R. T.; FLORESCU, R. Em busca de Drácula e outros vampiros. São Paulo: Mercuryo, 1995.
MELTON, John Gordon. O livro dos vampiros: A enciclopédia dos mortos-vivos. São Paulo: M.Books do Brasil, 2003.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. Em busca de outra história: Imaginando o imaginário. Revista
Brasileira de História. São Paulo, v. 15, n. 19, 1995.
STOKER, Bram. Drácula. São Paulo: Madras, 2002.

[1] Termo servo-croata para definir vampiro.
[2] Temor mórbido de um mal desconhecido (HOUAISS).
[3] Dissertação sobre vampiros.
[4] Vampiro, em italiano.
[5] Nome dado ao vampiro pelos bielorrussos, tchecos e eslovacos.
[6] Dissertação sobre as aparições de anjos, demônios, dos espíritos e fantasmas e vampiros na Hungria, Boêmia, Morávia e Silésia.
[7] MELTON apud CALMET, 2003, p. 223.
[8] Revista inglesa criada por Henry Colburn em 1814.
[9] Revista inglesa criada por John Christian Freund em 1871.
[10] Ordem fundada em 1888 por Samuel Liddell MacGregor Masters que estuda ocultismo.
[11] Nobre que se tornou membro da Ordem do Dragão em 1431.
[12] Vlad, o Empalador, em romeno.
[13] Nosferatu, Uma sinfonia de horror, de 1922.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Lâmia e Vampirismo Real - 11 anos depois...


Vocês lembram destas páginas?





É, já se foram 11 anos desde que elas foram ao ar pela primeira vez.
Muitas coisas aconteceram desde então. Fiz muitas amizades, algumas  que perduram até hoje. Também fiz muitos inimigos, alguns inclusive, que me ensinaram muitas coisas, que na época, talvez eu fosse jovem demais para perceber. Hoje sou grato a eles por ter aprendido um pouco mais.

Enfim, para comemorar estes 11 anos, e atendendo aos muitos pedidos, resolvi recolocar estas páginas no ar, no formato de blog. Não neste blog, novos blogs foram criados para hospedar este conteúdo e o conteúdo sobre a OSV (Ordo Sanctum Vampirii). Porém, todo o material sofrerá uma correção (há muitos erros de português) e uma atualização. Enfim, é só esperar, logo estará no ar novamente.

Espero que tenham gostado da novidade.

Abraços.

Marco.´.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

O Vampiro na literatura dos séculos XVIII e XIX – cont.

Continuando a publicação do artigo "O VAMPIRO LITERÁRIO DO SÉCULO XVIII AO XIX", feito por mim na Faculdade de História que estou fazendo na Saberes, coloco mais algumas partes. Se não viu as partes anteriores, então leia as duas anteriores aqui e aqui. Boa leitura!


3 O VAMPIRO LITERÁRIO DO SÉCULO XVIII AO XIX


2.2 De Coleridge a Stoker

A literatura vampírica chegou à Inglaterra em meados do século XVIII com poemas escritos por Goethe, Bürger e Tieck, mas só tornou-se parte da literatura inglesa quando

Samuel Taylor Coleridge escreveu o poema Christabel. No poema, escrito em 1816, ele nos apresentava Geraldine, uma vampira apaixonada pela personagem-título.

A aceitação de que o texto pudesse ter referências vampíricas só veio no século XX, graças a Arthur H. Nethercot, que

percebera nas características de Geraldine semelhanças com seres

vampirescos.

O poema Christabel também tem certo destaque pela retratação da relação lésbica das duas mulheres, sendo a primeira citação em toda a história literária dos vampiros.

2.2.1 Lord Ruthven

Como o poema Christabel gerava dúvidas se era ou não um poema relacionado a vampiros (esta dúvida somente seria esclarecida em 1930, pelo crítico literário Arthur H. Nethercot), algumas das mentes inglesas mais sapientes decidiram se reunir em Genebra, no ano de 1816, para criar suas próprias histórias de monstros.

O encontro aconteceu pelo acaso da viagem do lorde inglês George Gordon Byron.

Lord Byron, como é mais conhecido, se tornara um nobre inglês após o falecimento de um tio-avô, herdando assim o título e todos

os bens da família. Em 1813, Byron fez sua primeira aventura no

universo vampiresco com o poema The Giaour. Apesar de antecessor ao poema de Coleridge, Byron nunca reivindicou tal posição. O impressionante no poema é o conhecimento de Byron quanto à mitologia vampírica grega, tornando o personagem-título, o giaour (um marginal da fé cristã), em um vrykolaka, um não-morto que volta

para atormentar a família, bebendo do sangue deles.

Este foi o primeiro de vários poemas escritos por Byron acerca do tema, mas o texto que viria a ser o primeiro conto de vampiros na história da literatura mundial, só ocorreu após sua separação.

Em 1816, Byron iniciou uma viagem excursionaria pela Europa, ao lado do jovem médico John Polidori. Esse era pouco conhecido do mundo literário, pois sua única aventura nesse meio havia sido uma tese sobre o pesadelo. Na cidade sueca, Byron e Polidori receberam o casal Percy Bysshe Shelley e Mary Wollstonecraft Goldwin, e a irmã adotiva dessa, Claire Mary Jane Clairmont, e em uma noite chuvosa, decidem escrever contos fantasmagóricos. Para incentivar a mente de seus parceiros, Byron lê alguns contos do escritor alemão de ficção gótica, Ernst Theodor Wilhelm Hoffman.

Durante dois dias eles desenvolveram histórias dos mais diversificados tipos, sendo que, a história da jovem Mary, com 19 anos na época, fora a única que se tornara um best-seller, conhecido com Frankenstein, or The Modern Prometheus, que fora publicado em 1818, quando ela já se chamava Mary Shelley.

Byron teve sua colaboração contando a história de dois amigos que viajam a Grécia, aonde um deles vem a ser atacado e morto. Prometendo não contar sobre a morte de seu parceiro de viagem, o sobrevivente retorna a Inglaterra e depara-se com seu comparsa vivo e tendo um caso com sua irmã. O próprio escritor não dera muita relevância à história, mas seu amigo, o médico John Polidori gostara tanto, que anotara tudo.

Meses depois do encontro, Polidori seguira para a Inglaterra enquanto Byron continuou sua viagem. Quando esse retorna, em maio de 1819, encontra uma nota no jornal New Monthly Maganize com o título The Vampyre e colocando-o como autor. Mal sabia ele que o verdadeiro escritor era seu antigo companheiro de viagem, John

Polidori.

Quando retornara a Inglaterra, o jovem médico, que sonhava em ser um escritor, decidiu usar das anotações que fizera da história de Byron e desenvolveu o conto do jovem Aubrey. Um rapaz abastado, mas ingênuo que conhece Lorde Ruthven, e o acompanha em uma viagem pela Europa. Durante a viagem, Aubrey conhece outra faceta de Ruthven, de jogador e agiota, então decide se separar dele e seguir sozinho para a Grécia. Ao chegar ao país helênico conhece uma jovem que relata sobre o vampiro, um ser poderoso que é capaz das mais terríveis artimanhas. Os dois iniciam um romance, quando chega Ruthven. Dias depois da chegada do lorde, a jovem grega morre atacada por um vampiro. Sem

fazer ligação aos fatos, Aubrey aceita a mão amiga de Ruthven e ambos continuam a viagem juntos, mas numa noite de lua cheia, são atacados por ladrões e o lorde é morto. Antes de vir a falecer, pede a Aubrey que nunca revele a ninguém sobre sua morte. Sustentando a promessa, ele retorna à Inglaterra, aonde encontra sua irmã noiva de certo Conde Masden. Quando vai conhecer o conde, descobre que este é ninguém menos que Ruthven, mas por causa de sua promessa, nada pode revelar. Tenta impedir a união de ambos, mas não consegue e a irmã de Aubrey termina morta e Ruthven desaparece.

O conto ganhou fama na Europa, principalmente na Alemanha, aonde fora elogiado pelo romancista Goethe e na França, virando a peça Le Vampire, de Charles Nodier, em 1820. Ainda no país germânico, a obra virou uma ópera, intitulada Der Vampyr, de Henrich August Marschner, em 1829. Toda a fama era devido à suposta autoria de Byron, que conseguira sobre muita persistência que não lhe dessem a autoria pela obra, ainda mais por Polidori ter sido audaz em usar o nome Lorde Ruthven, no qual a ex-namorada de Byron, Lady Caroline Lamb, havia usado em seu livro intitulado Glenarvon, publicado em 1816, fazendo referência ao nobre escritor.

Byron, após este episódio, nunca mais mencionou vampiros em seus poemas ou contos, mas as mudanças já haviam acontecido e iniciado um enorme movimento literário sobre o assunto.


2.2.2 Um adendo

Com o sucesso do conto The Vampyre em toda a Europa, surgiram várias obras semelhantes, mas com a diferença de que o

vampiro não se dava bem no final, ao contrário de Ruthven, que assassinara a irmã de Aubrey e fugira, impune. Lógico que na peça de Nodier, Le Vampire, ele não saía impune, mas arcava com as consequências de seus atos. Em 1852 foi à vez de Alexandre Dumas, famoso romancista, levar Lord Ruthven aos palcos da França. Infelizmente, o verdadeiro criador da obra, John Polidori, não viveu muito para ver o sucesso de The Vampyre, pois se suicidara em 1821, dois anos depois de lançar o conto. Mas as crias surgiram anos depois. Entre eles, o que ganhou mais destaque foi Varney, de James Malcolm Rymer.

Rymer escreveu Varney, The Vampire: or, The Feast of Blood em 109 capítulos em 1840 e no mesmo ano, a obra virou um romance de 868 páginas. A crença daqueles que leram a obra era de que Rymer decidira fazer uma reimpressão mais extensa de The Vampyre, de John Polidori, pois todas as opiniões do escritor

encontravam-se naquele novo trabalho. Houve muitas confusões em referência a autoria da obra, tanto que o vampirólogo Montague Summers a atribuiu a Thomas P. Prest, autor da obra Sweeney Todd.

Depois da publicação de Varney, The Vampire, somente em 1870 que o escritor e explorador Richard Francis Burton viria a escrever Vikram and the Vampire. O romance era a primeira menção do mito vampírico relacionado à Ásia. Nele o autor se usa das lendas do Rei Vikram, uma figura real indiana que se tornou um gigante mitológico. A história se inicia quando o rei é enganado por um iogue, um tipo de místico indiano, que o convence a passar uma noite no local da cremação e no outro dia lhe pede para seguir por mais uns seis quilômetros ao sul e trazer um corpo que estaria pendurado nos galhos de uma mimosa, o corpo é de um betail, o vampiro hindu. Vikram demora a convencê-lo, mas quando acontece, durante o caminho de volta, o betail lhe conta várias histórias. Quando ambos chegam ao local da cremação, encontram o iogue convocando Kali. Em uma batalha homérica contra os mais diversos seres demoníacos indianos como rakshasas e bhutas, outros exemplo de vampiros hindus, Vikram mata o iogue e ganha dos deuses a fama que ostentou entre seu povo. A história publicada por Burton era parte do livro The Vetala-Pachisi, um tipo de Mil e Uma Noites indiano.

Anos depois, mais exatamente em 1872, na coletânea Glass Darkly, Joseph Thomas Sheridan Le Fanu publicou Carmilla.

Carmilla fora considerado o terceiro romance sobre um vampiro na literatura inglesa, já que o livro de Burton era uma republicação de um clássico indiano. O termo vampiro não cabe bem a personagem, que era uma mulher, mas que retomava o mesmo conceito criado pelo poeta Samuel Taylor Coleridge, ou melhor, de uma vampira lésbica.

A história de Carmilla é contada por Laura, desejo da personagem-título. Ela é filha de um funcionário público aposentado que adquiri um castelo em uma região rural da Estíria, na Áustria, onde os dois residem. A primeira aparição da vampira aconteceu quando a jovem tem seis anos e adormece nos braços de sua algoz, sentindo duas agulhas finas penetrarem no seu peito, ela grita, fazendo Carmilla desaparecer embaixo da cama. Quando a babá e a criada chegam ao quarto, não veem nada. Quando Laura completa 19 anos, Carmilla reaparece após um acidente convencional. A mãe dela a deixa no castelo, pois deseja chegar rápido ao destino de ambas. Quando a vampira e sua vítima se reencontram, ela é logo reconhecida, mesmo após treze anos. O que mais impressiona Laura é a semelhança de Carmilla com a Condessa Mircalla Karnstein, de quem Laura é descendente pelo seu lado materno.

Neste ínterim, chega ao castelo o General Spilsdorf, amigo do pai de Laura, para contar sobre a morte de sua filha, que morrera de causa desconhecida, por isso desconfiavam que tivesse sido um vampiro. O general foi cético quanto ao fato então permaneceu em tocaia no quarto da filha, quando viu a vampira conhecida como Mircalla adentrar novamente no aposento, Ele tentou matá-la com a espada, mas ela fugira. Ao fim do relato, Carmilla entra no aposento onde se encontram Laura, seu pai e Spilsdorf, esse a reconhece e antes de conseguir ferí-la, ela escapa novamente. Eles então a rastreiam até o Castelo dos Karnstein e encontram seu túmulo flutuando em sangue e seu corpo jovial. Providenciam então uma estaca em seu tórax, fazendo soltar um grito estridente, depois a decapitam, queimam seus restos e desfazem das cinzas no vento.

Nessa resumida interpretação do conto de Le Fanu, podemos ver como as formas de agir do vampiro viria a influenciar o mais célebre dos romances sobre vampiros, tanto na antiguidade como nos dias atuais, Drácula.